MILENE CUNHA
MAIS DE UM SÉCULO DE CONTROLE EXTERNO
Este ano de 2018 é um ano de festa para o controle externo. No dia 17 de janeiro
comemorou-se 125 anos da criação do Tribunal de Contas da União (TCU), órgão
idealizado e criado por Rui Barbosa e instituído pelo paraense Serzedelo Correa, com a
missão de ser um “corpo de magistratura intermediária à Administração e à
Legislatura que, colocado em posição autônoma, com atribuições de revisão e
julgamento, cercado de garantias contra quaisquer ameaças, possa exercer as suas
funções vitais no organismo constitucional”, exercendo a função de “um mediador
independente, auxiliar de um outro, que, comunicando com a legislatura e intervindo
na administração, seja não só o vigia como a mão forte da primeira sobre a Segunda,
obstando a perpetuação das infrações orçamentárias”, nas palavras do próprio Rui
Barbosa.
Já no dia no dia 06 de janeiro, celebrou-se 100 anos da criação do cargo de Auditor dos
Tribunais de Contas, instituído pela Lei nº 3.454/1918, com a função de relatar os
processos de contas perante o órgão julgador e de substituir os Ministros em suas
ausências. Desde a gênese da criação do cargo, seus ocupantes possuíam as atribuições
de uma judicatura especializada (de contas), sendo-lhes exigido profundos
conhecimentos jurídicos, contábeis, econômicos, financeiros e de gestão pública. O
cargo teve sua relevância acentuada com sua inserção expressa na Constituição
Democrática de 1988.
Apesar de seguir uma tradição histórica, é certo que, atualmente, a denominação
Auditor já não se mostra a mais adequada ao cargo. Isso porque à época de sua criação,
o nome Auditor remetia à acepção jurídica do termo, conforme registra o dicionarista
De Plácido e Silva: tal vocábulo era o título por que se designavam juízes ou
magistrados encarregados da aplicação de justiça em certo ramo ou espécie de
jurisdição.
Nas últimas décadas, com o predomínio das técnicas contábeis de origem anglo-saxã,
que consagraram a auditoria como uma técnica de fiscalização contábil de ampla
efetividade, a acepção contábil do termo “auditor” tem dominado o conceito, sendo
empregada aos detentores dessas atribuições, o que acaba por gerar uma confusão entre
cargos distintos, mas com denominação similar. No caso dos Tribunais de Contas, os
auditores de controle externo (antes denominados de analistas de controle externo) são
servidores que compõem o corpo técnico e instrutivo do órgão, cujas atribuições,
embora também muito importantes, não se confundem com as dos centenários
Auditores.
Não por outra razão, a fim de manter a acepção jurídica e seguindo diretriz da
Associação Nacional dos Membros dos Tribunais de Contas – ATRICON, o TCU
adotou a denominação de Ministro-Substituto para se referir ao centenário cargo. Outros
vinte e dois Tribunais de Contas também o fizeram, passando a designá-lo, no caso, de
Conselheiro-Substituto, em similitude ao que ocorreu com os juízes do trabalho e juízes
federais, que têm feito uso corrente da denominação de Desembargador do Trabalho e
de Desembargador Federal para se referir àqueles que compõem os respectivos
Tribunais Regionais.
Essas considerações se fazem necessárias para levantar uma importante reflexão, qual
seja, a de que mesmo passados 125 da existência de um órgão de controle externo, em
pesquisa realizada pelo IBOPE em 2016, 68% da população entrevistada afirmou não
saber o que é o Tribunal de Contas, nem o que ele faz. De igual modo, a atuação e o
cargo de Ministro e Conselheiro Substituto, ainda que centenário, também é
desconhecido por uma grande parcela da sociedade.
Assim, o momento de festejar também é uma excelente oportunidade para discutir
necessidades de aprimoramento ao tempo em que se demonstra a importante atuação
dos Tribunais de Contas em favor da sociedade, bem como mostra o trabalho exercido
pelos membros substitutos dos Tribunais de Contas, que ao lado dos titulares têm
atuado em prol do fortalecimento do controle e da correta aplicação do recurso público.
Milene Cunha é Conselheira Substituta do Tribunal de Contas do Estado Pará.
* O artigo foi publicado no Jornal O Liberal, Caderno Atualidades, p. 2, do dia 31 de
janeiro de 2018.