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Trabalho do Conselheiro Felipe Puccioni, TCM/RJ, é destaque em artigo do Estadão
Luz no fim do túnel na educação Programa piloto no Rio de melhora de gestão de 40 escolas municipais de ensino fundamental leva a aumento de 60% no aprendizado de matemática e português e já está sendo ampliado Por Fernando Dantas Um programa de melhora de gestão escolar, aplicado em 40 escolas públicas do ensino fundamental do município do Rio, entre janeiro de 2021 e dezembro de 2022, levou a um aumento de aprendizado de cerca de 60% em português e matemática, virtualmente sem elevação de custos. O conteúdo aprendido pelos alunos nessas matérias em dois anos, nas 40 escolas selecionadas para o programa, foi o equivalente ao que seria aprendido, na média do conjunto de escolas municipais do Rio, em três anos e três meses. Esse resultado foi apurado com metodologia científica e compõe a tese de doutorado em Cambridge de Felipe Puccioni, conselheiro do Tribunal de Contas do Município do Rio de Janeiro. Do total de aproximadamente 990 escolas de ensino fundamental da rede municipal do Rio (cerca de 450 mil alunos), o Programa Ciência e Gestão pela Educação (PCGE) selecionou aleatoriamente 40 (cerca de 16 mil alunos, ou pouco menos de 4% do universo total) para a aplicação do programa, e outras 40 como grupo de controle, sem a aplicação do programa. A amostra é representativa desse segmento da população escolar do Rio e, dessa forma, esses resultados devem se manter se o programa for escalado, o que já está ocorrendo. A partir de 2024, o programa começou a ser aplicado a outras 120 escolas da rede municipal do Rio. Se o sucesso se confirmar nessa segunda a etapa, há a ideia de expandir o programa para toda a rede, tida como a maior em nível municipal da América Latina. 40 anos de idade, formado em direito e matemática, com mestrado em administração pública, o carioca Puccioni tornou-se auditor do TCM em 2011, conselheiro substituto em 2016 e conselheiro em 2017, num processo que envolveu concursos, sabatinas e a nomeação política para o último degrau. Em 2019, com o prêmio Nobel de Economia para o casal Abhijit Banerjee e Esther Duflo (Michael Kremer também foi contemplado), Puccioni sentiu-se motivado a realizar no Rio o tipo de trabalho pelo qual a láurea foi concedida: um programa com objetivo de ter impacto social relevante, desenhado de forma a que os resultados pudessem ser mensurados de forma mais científica, e que pudesse ser escalado em caso de sucesso. Essa intenção combinou-se com o projeto de doutorado em Cambridge, em estudos de desenvolvimento econômico e social, a partir de 2020 (e que ainda está em andamento), tendo como orientador o economista brasileiro Tiago Cavalcanti. World Management Survey Puccioni tinha dúvida sobre a área do programa, e chegou a cogitar saúde (para a qual tem planos desse tipo no futuro). Mas aí pesou a orientação do conselheiro-presidente do TCM, Luiz Antônio Guaraná, que fez a conexão entre Puccioni e Renan Ferreirinha, secretário municipal de Educação do Rio. Tendo estudado economia e ciência política em Harvard, Ferreirinha era conhecedor e entusiasta do tipo de programa/experimento proposto por Puccioni. Estava decidido que o projeto seria em educação. O PCGE voltou-se à melhoria da gestão escolar em função de uma vasta literatura acadêmica que indica que avanços nesse quesito aumentam a produtividade. Por meio de Cavalcanti, Puccioni entrou em contato com pesquisa do economista americano Nicholas Bloom de 2014 que comprovava o impacto da gestão na produtividade no caso de empresas. A literatura aponta evidências de que o mesmo ocorre em áreas como saúde e educação. As ações concretas de melhora de gestão do PCGE não saíram da cabeça de Puccioni ou de outras pessoas envolvidas no projeto. A partir do World Management Survey (WMS, base de dados global e multisetorial voltada à gestão e produtividade), foi montado um programa de melhoria da gestão nas escolas composto por 23 práticas, testadas e comprovadas na literatura, abrangendo cinco áreas: liderança, monitoramento de performance e aprendizado, operações, recursos humanos e desenvolvimento de objetivos e metas. De maneira geral, explica Puccioni, esse conjunto de ações visa fazer o foco da equipe administrativa da escola sair da fixação na parte burocrática para mirar os resultados efetivos de aprendizagem dos alunos. Um aspecto crucial do programa foi que a pequena equipe de pessoas que tocou a primeira fase do PCGE (cerca de meia dúzia de profissionais ligados ao sistema de educação e ao TCM) engajou-se diretamente num trabalho de mentoria com os diretores e coordenadores pedagógicos das escolas, de forma a que estes se capacitassem melhor a compreender e utilizar os dados sobre desempenho de professores e estudantes. Diretores e coordenadores pedagógicos, por sua vez, estabeleceram uma rotina de reuniões regulares com cada professor para discutir resultados acadêmicos de classes e alunos, e como melhorá-los. Em escolas em zona de conflito, nas quais era arriscado levar os mentores, organizou-se para trazer os gestores escolares para reuniões com a equipe do programa fora da comunidade. O PCGE empregou a metodologia “Agile” que, ao contrário do planejamento tradicional, dá flexibilidade ao roteiro de ações, que pode ser modificado e adaptado à medida que novas necessidades e prioridades vão sendo identificadas. A metodologia da WMS permitiu mensurar a qualidade da gestão, e Puccioni aponta que a gestão das 40 escolas cariocas “tratadas” pelo programa ficou no nível de escolas europeias. Pisa Cálculos feitos pelo economista indicam que, se replicado ao Brasil inteiro e com os resultados obtidos na fase experimental no Rio, o PCGE levaria a nota média no Pisa do Brasil ao nível da nota chilena, o que equivale a três anos adicionais de aprendizado. Isso se daria quase sem gastar mais. Na sua etapa já concluída, o PCGE teve custo anual por aluno de apenas R$ 45. O Pisa é um exame internacional de qualidade de educação para alunos de 15 anos organizado pela OCDE, organização que reúne quase todos os países ricos e alguns emergentes. O Pisa abrange diversos países para além dos membros da OCDE. Em comparação ao… Read more »
Gestão e desempenho em escolas públicas
Por Tiago Cavalcanti* Um aspecto frequentemente – subestimado nos debates sobre o avanço da qualidade da educação no Brasil está relacionado ao papel da gestão nas escolas públicas. Em geral, é difícil isolar de forma sistemática o impacto das práticas de gestão sobre o desempenho escolar dos alunos. De acordo com o World Development Report de 2018 do Banco Mundial, o Brasil e vários países de renda média enfrentam uma crise de aprendizado. Em sua grande maioria, as crianças frequentam escolas, mas o aprendizado é sobremaneira baixo. Apesar do aumento real de 63% entre 2007 e 2019 no gasto médio por aluno do ensino fundamental nos municípios brasileiros, o desempenho dos alunos do país na prova do Programa Internacional de Avaliação de Estudantes (Pisa) de matemática, ciências e português não tem melhorado desde 2009. A prova Pisa busca medir a capacidade dos jovens de 15 anos em aplicar os conhecimentos adquiridos até o final do primeiro ano do ensino médio. Para se ter uma ideia do desempenho relativo dos nossos alunos em relação aos estudantes dos países europeus da OCDE, um estudo de Francesco Avvisati e Pauline Givord, publicado no periódico especializado Labour Economics, com base nos dados do Pisa, mostra que um jovem brasileiro de 15 anos precisaria, em média, de mais 8 anos em uma escola nacional para, supostamente, atingir o nível de conhecimento de um jovem de 15 anos europeu. Para compreendermos nosso desenvolvimento econômico e social, é fundamental entender onde estamos falhando na transformação de um maior investimento na educação em melhorias no aprendizado. Segundo o Ipea, o Brasil destina 6, 2% do seu PIB à educação como um todo, enquanto a média da OCDE é de 4, 9%. Se subtrairmos os gastos com Ensino Superior, a fração do PIB destinada a despesas com educação cai para 4%, ainda acima da média equivalente da OCDE, que é de 3, 4%. Isso demonstra que o esforço de nossa sociedade em alocar recursos financeiros para a educação não é inferior ao de outros países. Portanto, é importante entender se há ou não espaço para aumentar a eficiência dos gastos em educação do nosso país, por meio de intervenções que possam melhorar de forma sistemática a gestão nas escolas públicas, com efeitos positivos no aprendizado dos estudantes e na formação de capital humano. Isso é exatamente o que Felipe Puccioni busca responder no trabalho para seu PhD na Universidade de Cambridge, sob minha orientação acadêmica. Felipe elaborou uma pesquisa ambiciosa para identificar os impactos da melhoria na gestão das escolas públicas sobre o aprendizado dos alunos, utilizando o município do Rio de Janeiro como laboratório. Quarenta escolas públicas do ensino fundamental deste município foram selecionadas aleatoriamente para receber, durante dois anos, um programa focado na melhoria da gestão. Ele então compara o aprendizado dos estudantes nessas escolas selecionadas com o desempenho dos alunos em outras escolas públicas do município do Rio de Janeiro que não participaram do programa. Mais especificamente, o objetivo do programa elaborado por Felipe é fornecer conhecimento, treinamento, incentivo e ferramentas para que diretores, vice-diretores e coordenadores pedagógicos aprimorem substancialmente as práticas de gestão de suas escolas. Para isso, o programa, intitulado Programa Ciência e Gestão pela Educação (PCGE), fundamenta-se nas melhores práticas de gestão definidas por especialistas e discutidas e avaliadas em diversos congressos e artigos acadêmicos. Um ponto relevante do PCGE, que pode ser aplicado e estendido a outros municípios do país, é que, em vez de utilizar uma consultoria externa para implementar e monitorar a intervenção, o programa é executado por uma equipe interna de servidores do município do Rio de Janeiro. Uma parceria entre o Tribunal de Contas e a Secretaria de Educação do Município do Rio de Janeiro foi assinada para que servidores das duas instituições fossem alocados para implementar o programa nas escolas. Os servidores foram treinados para atuar por dois anos fornecendo mentoria e treinamento em serviço sobre as melhores práticas de gestão aos gestores escolares das escolas selecionadas aleatoriamente. O impacto do programa é bastante relevante e precisa ser divulgado. Em apenas dois anos, os alunos das escolas ‘tratadas’ aprenderam o equivalente ao que se aprende em um pouco mais de 3 anos nas escolas do Rio de Janeiro, em comparação com os estudantes das escolas que não participaram do programa. Ou seja, as escolas que receberam o apoio do programa foram 50% mais eficientes em melhorar o aprendizado de seus alunos em comparação com as escolas que permaneceram com o mesmo tipo de gestão anterior. Apesar do programa se basear em 23 diferentes práticas de gestão que estão integradas, dois fatores foram fundamentais para melhorar o aprendizado dos alunos. Primeiro, o aprimoramento da capacidade dos gestores escolares em observar e monitorar docentes e turmas com base em dados de aprendizagem. O segundo fator foi o uso de reuniões individuais periódicas pelos gestores escolares para discutir com os professores o desempenho dos alunos. Assim, os gestores podem abordar com os professores as necessidades de cada turma e de cada aluno, diagnosticando problemas e procurando soluções. Se os municípios brasileiros adotassem o PCGE, de acordo com a tese de Felipe, o Brasil poderia alcançar o mesmo nível de eficiência nos gastos com educação que países de renda alta, como França ou Estados Unidos, e atingir um desempenho na prova do Pisa semelhante ao observado no Chile. Além disso, com a eficiência atual, se gastássemos, por exemplo, 50% a mais por aluno, continuaríamos ainda abaixo do desempenho de outros países como o Chile. A pesquisa do Felipe Puccioni evidencia, portanto, que o nosso problema educacional parece ser mais com a eficiência dos gastos públicos em educação do que com o valor gasto por estudante. O estudo também destaca como a pesquisa em economia e gestão é uma ferramenta crucial para apoiar e avaliar políticas públicas. Na verdade, a maioria das políticas econômicas e sociais, como nos setores educacionais e de crédito, deveria primeiro ser implementada em pequena escala experimental e sujeita a avaliação, permitindo ajustes para mitigar possíveis efeitos… Read more »