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107 anos e contando, por Luiz Henrique Lima

Esta semana completaram-se 107 anos da criação de um dos cargos mais nobres, mais exigentes e mais desconhecidos da administração pública brasileira. Trata-se do cargo de Ministro Substituto do Tribunal de Contas da União, cuja correspondência, na esfera estadual, é Conselheiro Substituto do Tribunal de Contas. O cargo, então denominado Auditor do Tribunal de Contas, foi criado pela Lei 3.454/1918, especificamente no seu artigo 162, inciso XXVII, parágrafo segundo, letra b), com a competência de relatar os processos de contas perante a Câmara de julgamento do TCU, além de substituir os Ministros em suas faltas e impedimentos. A relevância da atuação dos seus ocupantes impôs crescenteprestígio no ordenamento jurídico, ao longo de diversasreformulações legais da atuação dos órgãos de controle, culminando na sua elevação à estatura constitucional em 1988. O título de Auditor origina-se da nomenclatura à épocaempregada para designar certas espécies de magistrados, mas que hoje subsiste apenas, de modo limitado, na Justiça Militar e na Desportiva. Atualmente, o termo auditor identifica o profissional responsável por planejar e executar trabalhos de auditoria e fiscalização, nas esferas pública e privada. Assim, especialmente a partir de 1988, consagrou-se a denominação Ministro ou Conselheiro Substituto. Como dito, trata-se de um dos cargos mais nobres, mais exigentes e mais desconhecidos da administração pública brasileira. A nobreza deriva da elevada responsabilidade atribuída a tais profissionais, que, além de presidirem, relatarem e apresentarem propostas de votos em processos de grande relevância e materialidade envolvendo a gestão de recursos públicas, devem estar permanentementedisponíveis para acumular tais funções com a substituição de ministros e conselheiros, em virtude de ausências, licenças, vacância ou outros afastamentos legais, podendo tais substituições limitar-se a um único processo, no qual ocorra suspeição ou impedimento, ou prolongar-se por vários meses e até anos. A exigência decorre do rigoroso e disputado concurso público obrigatório para alcançar o cargo, com a participação de centenas de candidatos para cada vaga e sucessivas etapas de provas objetivas, discursivas, orais e de títulos, bem como de rígidos filtros de conhecimentos acadêmicos, experiências profissionais anteriores e ficha limpíssima de antecedentes judiciais. Tais concursos exigem uma inigualada completude de saberes, muito além das disciplinas jurídicas, alcançando as ciências econômicas, contábeis, estatísticas e de administração. O desconhecimento, por sua vez, advém em parte do pequeno contingente de integrantes da carreira, sendo três ministros substitutos no TCU e pouco mais de uma centena em todas as demais cortes de contas. Não raro, tal desinformação alimenta situações contraditórias e decisões, em diversas instâncias, que contrariam a estaturae a independência constitucional da magistratura de contas. Felizmente, o Supremo Tribunal Federal, em sucessivas decisões unânimes, tem fixado uma robusta jurisprudênciade reconhecimento da dignidade deste cargo constitucionale de suas garantias e atribuições. E todos aqueles que examinam o panorama do controle externo brasileiro identificam o extraordinário papel que tem sido desempenhado por tais profissionais, contribuindo para a detecção de fraudes, correção de rumos e melhoria dos resultados das políticas públicas. Sua qualificação acadêmica tem sido determinante para a modernização dos procedimentos de fiscalização e a evolução jurisprudencial dos órgãos de controle, cada vez mais concentrados em atuações preventivas e de orientação aos gestores públicos. Parabéns aos colegas Ministros e Conselheiros Substitutos, em exercício ou aposentados, pelos 107 anos percorridos e pelos próximos!   Luiz Henrique Lima é professor e Vice-presidente de Controle Externo da AUDICON – Associação Nacional de Ministros e Conselheiros Substitutos dos Tribunais de Contas.

É sempre o orçamento, por Luiz Henrique Lima

Novo Ano e eu de volta com um velho assunto: o orçamento público. Lamento, mas é assim. Quando uma questão não é resolvida a tempo e a contento, o problema se arrasta, se agrava e se complica. É o que tem acontecido com os orçamentos públicos no Brasil. As distorções têm aumentado, em materialidade e relevância, e crescem exponencialmente os riscos para a governança das políticas públicas essenciais. Mais uma vez, um ano inicia e o país não tem uma lei orçamentária aprovada. Uma análise rasteira e apressada pode culpar o Legislativo e o seu insaciável apetite por emendas de quermesse, ou o Executivo, que ainda não consegue estabelecer um padrão de relacionamento republicano com os parlamentares, ou ambos e, ainda, o Judiciário, hoje ator ativo nessa discussão. Culpar é fácil, mas não agrega compreensão das raízes do problema, tampouco auxilia no desenho de soluções. O fato é que as leis orçamentárias – incluindo o plano plurianual, as diretrizes orçamentárias e o orçamento anual – são as leis mais importantes do país, do estado e do município, abaixo apenas da Constituição. Com efeito, a questão orçamentária é central na democracia. Decidir como serão aplicados pelos governos os recursos arrecadados dos cidadãos mediante a cobrança de impostos é uma das principais atribuições dos representantes eleitos do povo. E a nossa Constituição estabeleceu regras, princípios e prazos muito claros e corretos para a elaboração e a execução dos orçamentos. Entre tais princípios, merecem especial atenção, no momento, os do planejamento e da transparência. Ambos têm sido destroçados. De um lado, pelo Poder Executivo que insere nas leis anuais dispositivos que lhe autorizam previamente remanejar créditos orçamentários suplementares de uma dotação para outra em montantes por vezes superiores a dez por cento do orçamento global, representando verdadeiros “cheques em branco”. De outro, pelas emendas parlamentares que não guardam compromisso senão com o atendimento de compromissos individuais de seus autores que, embora legítimos em tese, no seu conjunto produzem uma barafunda de dificílimo controle e responsabilização e muito duvidosa efetividade e economicidade. Há tempos venho denunciando a desconstrução do orçamento brasileiro. Nos últimos cinco anos, foram nada menos do que doze emendas constitucionais alterando mais de uma centena de normas “permanentes”, que deveriam primar pela estabilidade. Muitos subestimam o tema, por considerá-lo excessivamente técnico. É um grave equívoco. O processo orçamentário é, essencialmente, um debate político fundamental sobre as prioridades nacionais e a distribuição de renda e encargos. Desmoralizar o orçamento é fragilizar a democracia. Reduzir a sua transparência é potencializar a ineficiência e a corrupção. Evitar essa discussão é falhar com o futuro e custará muito para o país.   Luiz Henrique Lima é professor e conselheiro independente certificado.

As contas de Beltrano, por Luiz Henrique Lima

Não é raro ouvir, aqui ou acolá, um comentário crítico questionando a aprovação ou a reprovação das contas desse ou daquele gestor. Geralmente tais observações são guiadas pela simpatia, antipatia, identificação ou rejeição em relação ao governante. Quando a pessoa se identifica com as suas ideias ou concorda com seus projetos, considera que o dever do tribunal de contas é o de aprovar e aplaudir o referido mandatário. De outro lado, quando se é oposição, exige-se que as contas sejam sumariamente reprovadas e os administradores penalizados com o rigor máximo autorizado pela lei. Mas não é assim que deve ser. O juízo deve ser técnico e imparcial. A incompreensão sobre o papel dos tribunais de contas não é recente. Em 1888, dois anos antes da criação do Tribunal de Contas da União, no seu romance ‘Os Maias’, Eça de Queiroz colocou na boca do personagem Carlos uma indagação que até hoje é compartilhada por muitos: “Que diabo se faz no Tribunal de Contas?” E a resposta do personagem Taveira traz a marca irônica do romancista português: “Faz-se um bocado de tudo para matar o tempo. Até contas.” É a palavra “contas” que gera alguma confusão. Numa acepção mais comum, “contas” remete a operações aritméticas, como adição, subtração, multiplicação e divisão. Um responsável por fraude nas contas seria alguém que manipularia os dados numéricos, ao subestimar receitas ou superfaturar pagamentos. Em outra perspectiva ultrapassada, analisar as contas limitar-se-ia à verificação da exatidão dos demonstrativos contábeis dos órgãos públicos, tais como balanços orçamentário, financeiro e patrimonial. Na realidade, quando apreciam ou julgam as contas de determinado administrador os órgãos de controle consideram um universo muito maior de dados. “Contas” é a denominação de um conjunto de informações que se possa obter, direta ou indiretamente, a respeito de uma dada gestão, desde que garantida a sua confiabilidade e permitida a avaliação da legalidade, legitimidade, eficácia, eficiência e economicidade dessa gestão. Tais informações não são restritas a documentos contábeis, mas também envolvem relatórios de gestão, indicadores de desempenho na execução de políticas públicas etc. Assim, no contexto do direito público, do controle externo e da auditoria governamental, “contas” é muito mais que um conceito contábil ou aritmético. Por isso, em diversos países os órgãos de controle começam a ser designados como tribunais da governança pública, cujas avaliações ponderam, para além da regularidade da arrecadação e da despesa públicas e da legitimidade e economicidade das ações governamentais, os resultados alcançados na consecução de objetivos programáticos e na concretização de direitos fundamentais, como a educação, a saúde, a segurança e a proteção ao meio ambiente. Os crescentes desafios de uma sociedade em acelerada transformação, em virtude, entre outros fatores, das inovações tecnológicas e mudanças climáticas, exigem que as instituições de controle, em todos os níveis, atuem com maior independência, imparcialidade e tempestividade, bem como com elevada qualidade e capacitação técnica e, ainda, inquestionável integridade dos seus servidores e magistrados.   Luiz Henrique Lima é professor e conselheiro substituto do TCE-MT.

Conselheiro substituto publica artigo sobre o impacto da Nova Lei de Licitações na advocacia pública municipal

O Conselheiro Substituto Isaías Lopes da Cunha, em coautoria com a jurista Paula Tavares Fernandes Kaiser, publicou um artigo intitulado “O impacto da Lei nº 14.133/2021 na concretização da carreira de advogados públicos nos municípios brasileiros”. O trabalho analisa a necessidade de criação de cargos efetivos de advogados públicos em municípios que, até então, não possuem advocacia pública municipal estruturada, considerando as disposições da Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos e a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF). De acordo com os autores, a Nova Lei de Licitações reforçou a importância da profissionalização na gestão pública, destacando que atividades como consultoria, assessoria jurídica e representação judicial são exclusivas de advogados públicos efetivos. A análise sustenta que municípios sem cargos efetivos na área deverão criá-los e preenchê-los para cumprir as disposições do art. 37, inciso II, da Constituição Federal e as orientações fixadas pelo STF no Recurso Extraordinário nº 1.041.210/SP. A publicação do artigo contribui de forma significativa para o debate jurídico e administrativo sobre a advocacia pública municipal, evidenciando a necessidade de mudanças estruturais para atender às novas exigências legais. Clique abaixo e acesse o artigo originalmente publicado na Revista Controle do TCE-CE: Artigo O impacto da Lei n 14133

Os tribunais de contas e a responsabilização financeira dos governantes: aplicação de multa e imputação de débito a presidentes da República, governadores e prefeitos, por Donato Volkers Moutinho

Os tribunais de contas e a responsabilização financeira dos governantes: aplicação de multa e imputação de débito a presidentes da República, governadores e prefeitos Donato Volkers Moutinho Doutor em Direito Econômico e Financeiro pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP). Bacharel em Direito e em Engenharia Elétrica pela Universidade Federal do Espirito Santo (UFES). Auditor de Controle Externo no Tribunal de Contas do Estado do Espírito Santo (TCE-ES), onde atualmente exerce o cargo de Secretário-geral de Controle Externo. Resumo: A Constituição de 1988 exige que todo aquele que manejar recursos públicos deve prestar contas. Enquanto as contas dos administradores e demais responsáveis por dinheiros, bens e valores públicos são julgadas pelos tribunais de contas, aquelas prestadas por chefes de Poder Executivo são julgadas pelos parlamentos, ainda que ordenem despesas, como decidiu o Supremo Tribunal Federal. Mas ainda é necessário investigar qual o impacto da ausência de competência das cortes de controle externo para julgar dos governantes no exercício das suas demais atribuições. Nessa lacuna, o objetivo deste artigo é entender se as cortes de contas podem sancionar ou imputar débito a presidentes da República, governadores e prefeitos. Com essa finalidade, analisa-se a responsabilidade financeira dos chefes de Poder Executivo à luz da Constituição, com aplicação do método dedutivo. Como resultados, observa-se a autonomia entre as funções judicante, fiscalizadora, sancionatória e reintegratória das cortes de contas, identificam-se as hipóteses constitucionalmente previstas para aplicação de multa e imputação de débito aos responsáveis e verifica-se que pode haver responsabilidade financeira dentro ou fora de processos de julgamento de contas. Conclui-se que os tribunais de contas têm competência para aplicar multa e/ou imputar débito a presidentes, governadores e prefeitos, desde que eles sejam individualmente responsáveis, respectivamente, por ilegalidade de despesa ou dano ao erário decorrente de infração a normas aplicáveis à gestão contábil, financeira, orçamentária e/ ou patrimonial da Administração Pública. Também se conclui pela necessidade de realização de duas alterações nas leis orgânicas das cortes de contas e em seus regimentos internos. Palavras-chave: Débito. Multa. Poder Executivo. Responsabilidade financeira. Tribunal de contas. Sumário: 1 Introdução – 2 Distinção entre fiscalização, julgamento de contas e responsabilização 3 Aplicação de multa e/ou imputação de débito a presidentes, governadores e prefeitos – 4 Alterações legais e regimentais necessárias – 5 Conclusão – Referências Clique abaixo e acesse o artigo originalmente publicado na Editora Fórum: Artigo_multa_TCs_prefeitos CS Donato Volkers Moutinho

Prescrição nos Tribunais de Contas e improbidade administrativa: uma proposta de racionalização da remessa de documentos ao Ministério Público.

Dualyson de Abreu Borba Graduado em Direito pela Universidade Federal do Maranhão (UFMA). Especialista em Direito Administrativo pela Universidade Anhanguera e em Direito Tributário pela Damásio Educacional. Mestre em Gestão Pública do Desenvolvimento pela Universidade Federal do Pará (UFPA). Auditor de Controle Externo do Tribunal de Contas do Estado do Pará (TCE-PA). E-mail: dualyson.abreu@gmail.com. Jackson Cardoso Rodrigues Graduado em Direito pela Universidade Federal do Pará (UFPA). Especialista em Direito Público pela Faculdade Damásio e detentor de MBA em Direito Previdenciário pelo Instituto Conext de Direito Social (ICDS). Auditor de Controle Externo do Tribunal de Contas do Estado do Pará (TCE-PA). E-mail: advogado.jcr@gmail.com. Julival Silva Rocha Graduado em Direito pela Universidade Federal do Mato Grosso (UFMT). Especialização em Direito Processual na Universidade Gama Filho. Mestre em Direito do Desenvolvimento da Amazônia pela Universidade Federal do Pará (UFPA). Conselheiro Substituto do Tribunal de Contas do Estado do Pará. E-mail: julival.rocha@tcepa.tc.br. Resumo: Este artigo propõe requisitos para que os Tribunais de Contas remetam a documentação ao Ministério Público competente nos casos de indícios de improbidade administrativa em processos de contas nos quais foi reconhecida a incidência da prescrição. A discussão é relevante na medida em que a remessa indiscriminada de processos de contas que envolva prescrição ao órgão ministerial se mostra contrária a alguns princípios que norteiam a própria atividade-fim dos Tribunais de Contas, quais sejam, a razoabilidade, a racionalidade administrativa, a economicidade e a eficiência. Para atingir o objetivo proposto, a pesquisa, realizada a partir de levantamento bibliográfico, normativo e jurisprudencial, debruçou-se sobre os principais aspectos teóricos e práticos que envolvem a prescrição no âmbito dos Tribunais de Contas, bem como a importância das Cortes de Contas na identificação de indícios de improbidade administrativa. Ao final, sugerem-se os seguintes critérios para o envio da documentação ao Ministério Público competente: (i) atendimento aos requisitos mínimos para julgamento das contas (relevância da matéria, materialidade, realização prévia de citação ou audiência, e eventuais exigências específicas da respectiva corte de contas); (ii) trânsito em julgado administrativo; e (iii) não ter transcorrido o prazo de oito anos previsto no art. 23 da Lei nº 8.429/1992. Palavras-chave: Tribunais de Contas. Prescrição. Improbidade administrativa. Remessa ao Ministério Público. Sumário: 1 Introdução – 2 A prescrição no âmbito dos processos de contas – 3 A relevância dos Tribunais de Contas na identificação de indícios de improbidade administrativa – 4 A improbidade administrativa em processos de contas envolvendo prescrição – 5 Conclusão – Referências.   Clique abaixo e acesse o artigo originalmente publicado na Revista Interesse Público: Artigo – Prescrição nos Tribunais de Contas e improbidade administrativa_ uma proposta de racionalização da remessa de documentos ao Ministério Público.