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E agora? – por Luiz Henrique Lima

No primeiro turno das eleições municipais, os brasileiros elegeram 5.516 prefeitos e mais de 58 mil vereadores. Parabéns aos eleitos por sua conquista! Parabéns também aos demais candidatos que, mesmo não sendo eleitos, com sua participação e propostas contribuíram para a vitalidade da democracia. Desejo sucesso a todos no exercício dos respectivos mandatos. Para isso, alguns cuidados são necessários e, desde já, devem ser adotados. Primeiro: estudar o orçamento para 2025 atualmente em debate nas Câmaras Municipais e, se for o caso, propor ajustes. Atuar de forma planejada e responsável, para que o último dia do mandato seja tão ou mais feliz que o dia da posse. Prefeitos e vereadores devem conhecer a composição das receitas e dos principais itens de despesas de suas cidades. A reforma tributária em curso trará alterações importantes, cujos impactos devem ser estimados. Benefícios fiscais devem ser avaliados e eventualmente revistos, caso não estejam alcançando os resultados pretendidos. A situação previdenciária merece atenção especial dos gestores e legisladores, tanto nos municípios que dispõem de fundo previdenciário próprio, quanto nos que recolhem para o regime geral. Trata-se de uma área muito sensível pela dimensão dos valores, pelo impacto social e econômico e pelos riscos envolvidos na correta arrecadação e aplicação dos recursos previdenciários. Outra área de enorme importância é a controladoria interna de prefeituras e casas legislativas. Quando corretamente estruturada, é fator crítico para o sucesso da gestão, prevenindo erros e fraudes, promovendo melhorias corretivas, reduzindo desperdícios e disfuncionalidades e assegurando correção e transparência. Não há bom gestor sem um bom controle interno. E quanto às políticas públicas finalísticas: educação, saúde e saneamento, meio ambiente, urbanismo etc.? É fundamental que os responsáveis conheçam os principais indicadores de resultados nessas áreas, como os resultados do IDEB, os índices de cobertura vacinal e mortalidade infantil, entre tantos outros. É muito recomendável a leitura dos relatórios de auditorias operacionais do Tribunal de Contas da União acerca de programas nacionais cuja execução é descentralizada nos municípios. Também é necessário o estudo das análises dos tribunais de contas locais acerca das contas de governo e de gestão dos exercícios anteriores de sua cidade, pois são fontes de preciosas informações sobre os resultados das políticas públicas, bem como sobre a gestão fiscal, patrimonial, contratual e de pessoal da administração direta e indireta. Nesses documentos, mais que a indicação de eventuais falhas ou irregularidades, constam determinações e recomendações para o aprimoramento da gestão pública. Vereadores e prefeitos! Honrem a confiança popular, atuando com zelo e integridade. Viva o Brasil! Longa vida à nossa democracia!   Luiz Henrique Lima é Conselheiro independente certificado e professor.

Independência – por Luiz Henrique Lima

Neste Sete de Setembro celebramos mais um ano de Independência. Como sempre, temos muito que comemorar pelo que alcançamos. De igual modo, há também muito que refletir e, mais ainda, assumir como compromisso coletivo para o futuro nacional. Se as conquistas foram muitas, são enormes os desafios a enfrentar. Tenho orgulho de viver numa democracia. Claro que não é perfeita. O sistema eleitoral é obsoleto e os representantes eleitos muitas vezes decepcionam. No entanto, temos eleições livres e o amadurecimento político da cidadania tende a reduzir os vícios herdados de uma longa tradição autoritária. Os movimentos sociais podem se manifestar livremente. As mulheres não sofrem restrições de direitos civis. Qualquer ato de discriminação racial ou religiosa é considerado crime. Possuímos uma avançada legislação de proteção ao meio ambiente. Em todos esses aspectos, o Brasil se situa bem à frente de muitas outras nações, inclusive mais antigas e economicamente mais poderosas. Em outras áreas, todavia, nossa posição é vergonhosa. Refiro-me, especialmente, ao sistema educacional. Em todas as avaliações internacionais, o Brasil ocupa uma péssima colocação, tanto no ensino fundamental, como no médio, no técnico, no superior e na pós-graduação. É assombroso o índice de analfabetos funcionais, que mesmo tendo frequentado alguns anos de escola, não conseguem interpretar um texto simples ou realizar operações matemáticas básicas. A expansão do número de matrículas não foi acompanhada das necessárias capacitação e valorização dos professores, resultando em êxodo de muitos entre os melhores profissionais e em sacrifício da qualidade do ensino. Desde o Império, diversos programas governamentais na área da educação priorizaram obras e equipamentos em detrimento dos professores, que deveriam ser tão respeitados e bem remunerados como, por exemplo, juízes ou fiscais de tributos. A carência no sistema educacional engendra múltiplas consequências negativas. Na saúde pública, pela falta de conhecimento de hábitos higiênicos e alimentação sadia. Na produtividade econômica, pela falta de capacitação da mão de obra. Na desigualdade social, porque baixa qualificação implica em baixa remuneração. Na proteção ambiental, devido aos despejos inadequados de resíduos em mananciais e áreas de proteção e à prática de queimadas e outras formas predatórias de exploração de recursos naturais. Assim, a tragédia educacional brasileira é a mãe da maior parte de nossas vicissitudes, pois o indivíduo sem educação não é capaz de desenvolver plenamente o seu potencial. Neste Sete de Setembro, celebremos a Independência, comemoremos a democracia, orgulhemo-nos de nossas riquezas e de nosso povo, mas também assumamos o compromisso de, no prazo de uma geração, proporcionar a todos os brasileiros uma educação de qualidade. Desta forma, a independência, enfim, será completa. A versão original deste artigo foi escrita e publicada em 2013. Troquei meia dúzia de palavras, mas a essência não se alterou. Se, por um lado, os extremistas autoritários foram contidos: por outro, os avanços sociais foram insuficientes. A luta continua.   Luiz Henrique Lima é Conselheiro Substituto do TCE-MT e professor.

Cinco frentes no combate à corrupção – por Luiz Henrique Lima

Publicado pelo Tribunal de Contas da União, o ‘Referencial de combate a fraude e corrupção’ é um documento que merece leitura atenta e frequente. De fato, lutar contra a corrupção é uma tarefa de todos os dias nos mais diversos setores da vida social. É do interesse de organizações públicas, privadas e do terceiro setor. Afinal, sociedades onde grassa a corrupção tendem a ser mais atrasadas no seu desenvolvimento econômico e social, mais desiguais, mais autoritárias, mais injustas e mais violentas. É importante assinalar que esse fenômeno é mundial, a ponto de um dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável da Agenda 2030 das Nações Unidas ser “reduzir substancialmente a corrupção e o suborno em todas as suas formas”. Na sua fundamentação, o TCU emprega a Teoria do Triângulo da Fraude, segundo a qual, para que uma fraude ocorra, é necessária a ocorrência de três fatores: pressão ou motivação, oportunidade e racionalização. O Referencial propõe cinco frentes no combate à corrupção: prevenção, detecção, investigação, correção e monitoramento. Todas se complementam e cada uma delas exige a adoção de um conjunto de medidas para aprimorar a governança e a gestão de riscos. A prevenção tem como fundamento a cultura organizacional, cujos pilares devem ser a ética e a integridade. Mais que um código, a cultura ética exige condutas exemplares emanadas da alta administração que precisa ser um modelo de ética e de integridade, tanto nas decisões gerenciais quanto no comportamento pessoal. Quando os membros da equipe duvidam da integridade dos seus líderes, há terreno fértil para vicejar a corrupção. Ademais, devem ser implementados mecanismos de transparência, responsabilização e controles preventivos. Por sua vez, a detecção faz uso de ferramentas como canais de denúncias e depende da adequada estruturação e funcionamento da auditoria interna. A investigação ocorre quando há indícios da ocorrência de fraude ou corrupção. Seu êxito é essencial para identificar falhas organizacionais e dissuadir a repetição das irregularidades. Deve ser conduzida de modo imparcial para evitar exposições injustas ou juízos precipitados, mas firme e tempestivo de modo a não promover a impunidade. Correção envolve reparar ou mitigar o dano e responsabilizar os seus autores, de acordo com o devido processo legal. Por fim, o monitoramento implica no acompanhamento contínuo da higidez dos controles, na capacitação e sensibilização dos colaboradores, na atualização das normas e na adequação dos meios para o bom desempenho das demais frentes de combate. A corrupção é como mato num belo jardim. Se não houver zelo, ele surge, se espalha, cresce e toma conta de tudo, com as ervas daninhas e parasitárias sufocando as plantas medicinais, as árvores frutíferas e as flores. Gestores e cidadãos devem ser bons jardineiros.   Luiz Henrique Lima é Conselheiro Substituto do TCE-MT e professor.

IDEB no Brasil: precisamos melhorar muito – por Luiz Henrique Lima

A divulgação nesta semana dos resultados do IDEB-2023 trouxe grande alvoroço. Autoridades e políticos não pouparam declarações, ora para exaltar seus próprios feitos, ora para criticar os seus rivais. Ainda bem! Isso é ótimo. Considero um sinal de evolução e amadurecimento democrático o fato de os resultados de um indicador objetivo da educação merecerem a atenção das nossas lideranças e alcançarem protagonismo nos debates sobre o desempenho das políticas públicas. Dito isso, observa-se que existem três diferentes maneiras de apresentar os resultados do IDEB e uma análise mais completa requer que sejam consideradas no seu conjunto. A primeira forma é expor as notas pelo seu valor absoluto e compará-las com as metas que se pretendia alcançar. A segunda é verificar a evolução histórica das notas ao longo das diversas edições do IDEB. Há evolução, estagnação ou piora? Qual a tendência? O ritmo é lento ou acelerado? Finalmente, a terceira possibilidade é o ranqueamento das notas entre os estados e municípios. Quem está na frente, quem ficou para trás? Minha cidade ou estado “subiu no pódio” ou está “ameaçado de rebaixamento”? Reforço que a melhor análise é a que leva em conta todos esses aspectos, pois, por exemplo, pouco adianta um município ser o mais bem colocado na sua região, mas a sua nota ter regredido em relação à avaliação anterior ou ter se distanciado da meta. Nesse caso, teria ocorrido uma melhora na posição relativa, mas uma piora efetiva na qualidade educacional. Vejamos o que nos revela o IDEB-2023. Em todo o país só foi atingida a meta dos anos iniciais do ensino fundamental. Nos anos finais e no ensino médio, ficamos 0,5 e 0,9 abaixo da meta, respectivamente. Somente dois estados superaram a sua meta específica (GO e PI), além de um que a igualou (PE); os demais não lograram êxito. A nível nacional, tanto em português como em matemática, em relação a 2019 as notas pioraram para todos os grupos (anos iniciais e finais do ensino fundamental e ensino médio). Alguns dados surpreendem, indicando que os resultados educacionais não estão automaticamente relacionados ao PIB ou mesmo ao IDH. Dos dezenove municípios com notas superiores a 7,0 ao final do ensino fundamental, dezoito estão na Região Nordeste. Por outro lado, RS, SC, DF e RJ apresentam alguns dos piores resultados estaduais, em termos relativos e em relação às respectivas metas. Em síntese, apesar de alguns avanços pontuais que merecem elogios, ainda estamos muito distantes do desejável e mesmo do possível. Afinal, se municípios pequenos e pobres, distantes das capitais, conseguem bons resultados, o que explica as notas medíocres ou ruins da grande maioria? Os resultados do IDEB devem ser objeto de minucioso estudo e de amplos debates, com a participação de gestores, especialistas, professores e dos milhares de conselhos de educação e de cada escola. Conhecer o que funciona na aprendizagem e disseminar e multiplicar as melhores práticas é um imperativo prioritário e urgente para que todos os brasileiros tenham uma educação de qualidade.   Luiz Henrique Lima é Conselheiro Substituto do TCE-MT e professor.

Ponto de reflexão: meta de resultado primário superavitário para entes com finanças saudáveis – por Omar Pires Dias

Notícias relacionadas à situação das contas públicas, especialmente na esfera federal, rotineiramente são divulgadas. Que as metas de resultados fiscais têm déficit recorde, o que torna a meta fiscal do ano, de tantos bilhões de reais, quase impossível. Que, novamente, o governo gastou mais do que arrecadou, levando o setor público a um déficit primário da cifra de bilhões. Não precisa ser analista de economia para perceber que as previsões de alcance da meta de resultado primário, prometidas pelo governo, quase sempre não são alcançadas. Decerto deriva de fatores como: falhas de planejamento, baixa arrecadação, surgimento de novas despesas obrigatórias ou mesmo fatos imprevisíveis que oneram o orçamento primitivo, dentre outros. Estamos falando em elaboração e execução orçamentária dos entes federados, com a incorporação das metas fiscais, em plena égide da Lei de Responsabilidade Fiscal, que surgiu no mundo jurídico em 4 de maio de 2000, elegendo o controle do endividamento público como um dos principais focos de uma gestão fiscalmente responsável. A Lei de Responsabilidade Fiscal (Lei Complementar nº 101/2000) tornou obrigatório o controle dos gastos dos entes federados, basicamente condicionando-os à capacidade de suas arrecadações. Logo no seu preâmbulo (art. 1º, §1º) consta que a responsabilidade na gestão fiscal pressupõe a ação planejada e transparente, em que se previnem riscos e corrigem desvios capazes de afetar o equilíbrio das contas públicas, mediante o cumprimento de metas de resultados entre receitas e despesas e a obediência a limites e condições no que tange a renúncia de receita, geração de despesas com pessoal, da seguridade social e outras, dívidas consolidada e mobiliária, operações de crédito, inclusive por antecipação de receita, concessão de garantia e inscrição em Restos a Pagar. É patente que havia uma total desordem das finanças dos entes nacional e subnacionais, com déficits imoderados e reiterados, levando o legislador infraconstitucional a adotar tal medida, no sentido de dar um basta aos constantes desequilíbrios das contas públicas, causa principal do aumento do endividamento. A partir de então, a União, os estados (incluindo o DF) e os municípios foram obrigados a implementarem uma nova roupagem aos seus planejamentos, posto que passou a integrar a Lei de Diretrizes Orçamentárias o Anexo de Metas Fiscais, em que serão estabelecidas metas anuais, em valores correntes e constantes, relativas a receitas, despesas, resultados nominal e primário e montante da dívida pública, para o exercício a que se referirem e para os dois seguintes (LRF, art. 4º, §1º). Não bastasse o estabelecimento das metas de resultados fiscal, também se exige esforços para atingir tais objetivos, ainda que os entes tenham que contingenciar seus orçamentos, com limitação de empenhos e movimentação financeira (art. 9º). O déficit público ocorre quando o governo gasta mais do que arrecada. Para cobri-lo, como acontece na esfera federal, o governo recorre ao mercado financeiro, tanto mediante a emissão de títulos públicos, como por meio de empréstimos. Consequentemente, há o aumento da dívida pública. A dívida é onerada pelos seus encargos – os juros, que poderão torná-la uma bola de neve, caso ao menos esses juros não forem pagos regularmente. A busca do equilíbrio das contas públicas e até mesmo a redução da dívida, exige esforço fiscal. Por um lado, o Estado precisa gastar menos e com eficiência. Por outro, precisa arrecadar mais. Feita a fixação das metas fiscais, durante a execução orçamentária, devem ser publicados os relatórios (RREO e RGF) bimestralmente e quadrimestralmente (arts. 52 e 54), visando mostrar o cumprimento das metas fiscais e limites de despesas, e favorecer a tomada de providência (limitação de empenho), caso haja a possibilidade de não atingimento dessas metas e limites no período levantado. Por obrigação imposta pela LRF (art.59) e pelos próprios tribunais de contas, os relatórios fiscais são por estes analisados. Ao menos nas análises das metas fiscais dos municípios no âmbito do TCERO, o que se percebe é um total descompasso entre as metas estabelecidas de resultados primário e nominal e as que efetivamente foram realizadas. Nas últimas contas anuais dos 52 municípios analisadas pelo TCERO, um tanto acima de 70% não atingiu as metas de resultados primário e nominal. Percebe-se nessas contas que a maioria dos municípios não tinha sequer necessidade de fazer previsão de resultado primário superavitário, porquanto o endividamento era baixíssimo ou inexistente. Revelando ausência de um planejamento condizente, dentro da realidade fiscal. Segundo a STN, o principal parâmetro para a previsão do resultado primário, quando da elaboração do AMF, é o endividamento (Manual de Demonstrativos Fiscais – MDF,14ª edição – 2023, p. 245). No que lhe cabe, o TCERO sempre manteve firme a exigência aos seus jurisdicionados de um eficiente planejamento das metas fiscais e consequente atingimento de resultados. Para esse propósito, tem disponibilizado capacitações específicas com renomados professores. A despeito disso, é notória a complexidade do planejamento fiscal para municípios que não possuem uma estrutura técnica razoável. Conforme a STN, o reconhecimento do cenário macroeconômico é essencial para o planejamento dos itens das metas fiscais, exigindo pesquisa aprofundada para identificar e utilizar as principais variáveis exemplificadas, como o PIB real (crescimento % anual), taxa real de juro implícito sobre a dívida líquida do Governo (média % anual), câmbio (R$/US$ – final do ano), inflação média (% anual) projetada e projeção do PIB do ente. Somente após a ponderação das variáveis econômicas, deve ser iniciado o processo de planejamento das metas de acordo com a política fiscal do ente (Manual de Demonstrativos Fiscais – MDF, 14ª edição – 2023, p. 73. Sem sombra de dúvida, é uma tarefa demasiadamente difícil para municípios pequenos cumprirem todo esse rito. A par dessa carência, o TCERO evolui na forma de apontar a falha pelo não atingimento das metas fiscais de resultado primário e nominal dos municípios rondonienses. Se antes usava de uma maior rigidez ao chamar a responsabilidade os gestores, agora opta por mitigar a irregularidade, sem prejuízo das necessárias recomendações de melhoria. A título de exemplo, na sua fundamentação, o Conselheiro Edilson Silva, relator das últimas contas dos municípios de Buritis e Machadinho do Oeste, pondera que, sendo… Read more »